Por: Jorge Henrique (Presidente do SindEnfermeiro-DF)
No dia 19/09, a lei nº 8.080/1990, responsável pela regulamentação do Sistema Único de Saúde, completou 35 anos. A lei orgânica, tal como é conhecida, positiva determinações importantes do campo da saúde coletiva: a reorganização do nível central através do papel do estado na condução da política de saúde; a descentralização e desconcentração administrativa, econômica, política, financeira e geográfica; a participação social; o planejamento, a execução e avaliação das políticas de saúde; e a inter-setorialidade através da conjunção de várias as forças sociais.
Estes elementos convergem para garantir um princípio fundamental do SUS e um alicerce para a construção de políticas e programas de saúde, a integralidade. Só é possível pensar em sua materialização através de uma Rede de Atenção à Saúde (RAS), regionalizada e organizada em diferentes níveis de complexidade dos serviços para atender as demandas da população.
Para a situação da saúde e de vida da população brasileira, que é caracterizada pela falta de saneamento básico e água potável, insegurança alimentar e desnutrição, pelo alto índice de contaminação por agrotóxicos, contaminação da água, por grandes desastres, pelas diferentes formas de violência, além dos problemas climáticos, ambientais, demográficos, migratórios, é essencial que a RAS esteja distribuída nos diversos territórios, principalmente nos mais remotos.
A prática da Enfermagem, neste contexto, através de profissionais que atuam principalmente em equipes de saúde da família, tem uma imensa capacidade de absorver diferentes determinações de saúde dos territórios. É a enfermagem, através dos sistemas universais, como o SUS que fazem vigilância dos territórios, de forma integrada, socioespacial, geográfica, com enfoque na ecologia humana.
Dentre as variadas ações gerenciais, assistências e coletivas nos territórios, a Enfermagem atua em busca de estabelecer comunicação com as comunidades, de contornar as adversidades, estabelecer e reestabelecer fluxos de atendimento para os usuários, viabilizar a continuidade do cuidado às pessoas, democratizar o acesso à assistência e dar resolutividade aos serviços de saúde.
Ao longo destes 35 anos, a Enfermagem vem redefinindo o escopo de práticas na saúde pública devido às mudanças no perfil epidemiológico, ao envelhecimento da população, aos novos determinantes do processo saúde-doença, às doenças emergentes, ao aumento da diversidade étnica e cultural da população, ao avanço tecnológico e principalmente devido a sua maior inserção no SUS.
Hoje, no âmbito do SUS, o Enfermeiro é responsável por realizar consultas de rotina, pré-natal de gestantes, coleta de citopatológico, puericultura, testes diagnósticos, prescrição de medicamentos e solicitação de exames com base em programas e protocolos, inserção de métodos contraceptivos de longa duração (DIU), realização de parto natural, desbridamento instrumental, manejo avançado de curativos, gerenciamento e aplicação de imunobiológicos, além de outras práticas.
Apesar de toda essa evolução, a Enfermagem ainda sofre com condições precárias de trabalho, jornadas extenuantes, altos índices de acidentes de trabalho, restrições físicas e psíquicas, violência e baixa remuneração. É necessário, portanto, que o “ecodesenvolvimento da Enfermagem” se dê a partir do confronto às velhas formas de dominação no campo político, revitalizando a economia em direção a ações coletivas, com estratégias que mudem os processos produtivos para atender as reais necessidades da população.
Profissionais da Enfermagem devem reafirmar o Sistema Único de Saúde (SUS) como uma conquista do povo brasileiro, lutar por uma política perene de investimento pautada na atenção às demandas sociais, pois são elas que agenciam o processo de inovação tecnológica e orientam a construção de sistema com uma base produtiva de bens e serviços. Por isso, estes profissionais devem lutar pela inclusão e atendimento digno a pessoas em situação de rua, a pessoas que fazem uso de álcool e outras drogas, à população LGBTQI+, indígenas, negros e negras, pessoas em situação de violência, expostas a agrotóxicos etc.
A categoria deve aliar o desenvolvimento técnico e científico à organização política, com fortalecimento das entidades representativas (sindicatos e associações) para disputar e consolidar espaços de poder na sociedade. Estas iniciativas devem ser subjugadas à luta social geral, que exige justiça social, redução das desigualdades sociais, mais investimentos em políticas públicas, e redução da jornada de trabalho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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