“Sou uma entusiasta da universidade pública, porque vejo quanto o trabalho é sério e forma profissionais que saem para fazer a diferença no mundo”. É assim que Ana Catarine Carneiro, enfermeira há mais de uma década, começa se descrevendo. Formada pela Universidade de Brasília, Catarine atua como enfermeira da Secretaria de Saúde e preceptora da Residência Multiprofissional em Cuidados Paliativos, mas já foi professora na Escola Superior de Ciências da Saúde (ESCS).
Especialista em Clínica Médica e em Cuidados Paliativos, Catarine desenvolve suas atividades no Hospital de Apoio de Brasília (HAB). A paixão pela área surgiu ainda na faculdade. No entanto, as aulas de anatomia eram uma parte complicada. “Tinha muito medo da morte, desse fim que ela representava, dessa coisa assustadora que a gente imagina”, revela Ana Catarine.
A morte tem algo a ensinar
Apesar do receio, Catarine continuou estudando e aprofundou seus estudos sobre o que a morte representava. “Quando fui pesquisar, achei incrível que pessoas falavam sobre isso. A minha sensação de temer a morte, de não entender, era algo compartilhado com todo mundo e que ao mesmo tempo havia algo a aprender com aquilo. Não era algo que tínhamos que temer e não saber lidar. Foi aí que me apaixonei pelos cuidados paliativos”, relembra.
Depois disso, Catarine começou sua jornada nos cuidados paliativos. Congressos, seminários, palestras… Todos os eventos sobre o assunto despertavam o interesse dela. Iniciou-se então uma verdadeira história de amor entre a enfermeira e a futura área de atuação. “Os cuidados paliativos são o ápice da humanização. Eles caminham juntos. Isso que me encanta”, destaca Ana.
Militância pelas enfermeiras e enfermeiros
Ana Catarine, que também é diretora do SindEnfermeiro-DF, ganhou visibilidade no Brasil e fora do país ao ser agredida de forma covarde em 1° de maio. Ana e outros profissionais da enfermagem faziam um protesto silencioso na Praça dos Três Poderes em memória das dezenas de colegas mortos por conta da Covid-19, quando apoiadores do presidente Jair Bolsonaro atacaram ela e outra enfermeira.
As imagens ganharam repercussão nacional. Catarine ao ver que a colega poderia ser agredida fisicamente pelo homem visivelmente descontrolado, ficou na frente dele e não disse uma palavra. O movimento #LuteComoUmaEnfermeira começou a ganhar visibilidade com essa atitude.
“Eu acompanhei a pandemia antes dela chegar no Brasil. Via as notícias com um aperto no peito. Quando ela chegou aqui, a enfermagem, os enfermeiros foram muito afetados. Começamos a ter muitas perdas. O ato de 1º de maio representava um sentimento de muito pesar pelo que os enfermeiros estavam passando e muito desejo de mudança. Um desejo para que os gestores e a população olhassem por nós. Era um pedido de socorro”, relembra Ana Catarine.
“Os sindicatos são ferramentas de defesa dos trabalhadores. Naquele dia 1º de maio o SindEnfermeiro foi exemplo disso: ouvimos o anseio de enfermeiros em realizar a homenagem e o pedido de ajuda e planejamos juntos para que todos ficassem em segurança. Teve a homenagem do dia 12 de maio também. Assim como eu senti muita emoção, acredito que outros enfermeiros puderam sentir orgulho da categoria a qual pertencem naquele momento”, pontua.
Enfermagem é resistência
Antes de agredir fisicamente as profissionais, os apoiadores do presidente destinaram aos participantes do ato todos os tipos de agressões verbais possíveis. Não satisfeito, um dos agressores começou a direcionar palavrões e outras ofensas à enfermeira ao lado de Ana. Sem sucesso com as provocações, o homem começou a gritar cada vez mais alto e perto da enfermeira, até que Ana Catarine posicionou-se à frente da colega, despertando a ira do homem.
“Até então meu sentimento de tristeza foi substituído pelo sentimento de proteção. Tinha que proteger aquela enfermeira. Eu queria mostrar para ele, que ela não estava sozinha, que eles não iriam nos assustar, nem nos diminuir. Tive esse sentimento muito forte”, ressalta.
#LuteComoUmaEnfermeira
Cantores, atrizes, atores e influenciadores digitais publicaram fotos em suas redes sociais com a frase #LuteComoUmaEnfermeira, lema que ganhou força depois do ato de 1º de maio. “Quando eu comecei a ver as enfermeiras, os enfermeiros usando a hashtag, tive orgulho do que a gente estava fazendo. Tive muito orgulho da nossa categoria e do que nós somos capazes. Além da sensação de pertencimento à categoria”, relata.
Sobre os frutos desse movimento Ana Catarine é direta, e deseja que a população entenda que a enfermagem está presente e que a categoria é guerreira. “A enfermagem não vai retroceder e que iremos nos unir cada vez mais. Desejo que consigamos proteger os enfermeiros, porque a pandemia não acabou. Tenho colegas com sequelas. Conhecidos morreram. Os profissionais de saúde lutam muito pelo bem da população, não falo só como enfermeira, falo como população”, finaliza.