O Sindicato dos Enfermeiros do Distrito Federal (SindEnfermeiro-DF) vem demonstrar sua preocupação frente às Notas Técnicas 01/2019 SES/SAIS/COAPS e 02/2019 SES/SAIS/COAPS que estabelecem as diretrizes necessárias para o funcionamento das Salas de Acolhimento das Unidades Básicas de Saúde – UBS TIPO II, conforme portaria SES nº 77/2017 e a ampliação do horário de funcionamento das UBS até 22h.
É preciso que fique claro que este sindicato apoia totalmente o projeto Sala de Acolhimento, assim como a atuação do enfermeiro nesses espaços – tanto nas UBS, como nas UPAs e emergências, tendo em vista não apenas a legalidade, mas também a comprovação dos estudos científicos existentes que trazem a eficácia dessa estratégia e seus claros benefícios à sociedade. Porém, a forma com que a iniciativa vem sendo planejada e executada compromete o seu êxito.
A realidade encontrada na maioria das UBS é o déficit de profissionais em todas as categorias e a definição do contingente de atuação das equipes bem maior que o preconizado no Programa Estratégia Saúde da Família (ESF). Existem equipes incompletas desde o início do processo de conversão do modelo tradicional para ESF – em algumas faltam médicos, outras enfermeiros e técnicos de enfermagem e, na grande maioria faltam agentes comunitários de saúde (ACS), elo fundamental das equipes com os usuários.
Com a quantidade de equipes inconsistidas, os poucos profissionais se encontram atolados em atendimentos de emergência, mal conseguindo fazer o básico (crescimento e desenvolvimento, pré-natal, atendimento de rotina do hipertenso e diabético, imunização, promoção e prevenção, etc.). Esse contexto de sobrecarga vem elevando o índice de absenteísmo e faz com que os profissionais que permanecem no trabalho atendam uma população ainda maior fazendo disso um ciclo de caos.
A Nota Técnica afirma que a Sala de Acolhimento deverá funcionar durante todo o horário de atendimento da UBS, que é 65h/semanais com a presença de 1 (um) enfermeiro e 1 (um) técnico de enfermagem extra equipe. É evidente que as 40h de jornada semanal do enfermeiro são incapazes de cobrir todo o horário de funcionamento da Sala de Acolhimento. Outro ponto a se destacar é que esses profissionais seriam “extra equipe”, e o projeto Sala de Acolhimento já está em funcionamento. No entanto, esses profissionais ainda não estão atuando nas UBSs, sobrecarregando ainda mais as equipes.
Essa nota também não prevê reposição de carga horária profissional nos casos de férias e afastamentos legais, acarretando em maior sobrecarga aos enfermeiros das equipes, e causando cancelamentos de agendas e demais atendimentos previamente definidos. Por outro lado, também se entende que, tendo em vista todo esse quadro de absenteísmo e equipes incompletas ou inconsistidas, incorre-se na possibilidade de que os profissionais das Salas de Acolhimento absorvam demandas das equipes, mais uma vez fugindo do regime da Estratégia de Saúde da Família e não vinculando o paciente à sua equipe, transformando o atendimento que deveria primar pela promoção e prevenção da saúde em apenas mais uma “porta” de atendimento de urgência sem a devida efetividade.
Da mesma maneira, a Nota Técnica nº 1/2019 – que estendeu o horário de funcionamento até as 22h, passa também pelas mesmas dificuldades, ou seja, sem aumentar dimensionamento e sem estruturar serviços de apoio necessários, como: farmácia, medicação, curativo, regulação, imunização etc. O questionamento é qual será a efetividade do atendimento? Serão apenas números que trazem a falsa ideia de acesso para estatísticas, como aconteceu com uma conversão em ESF atropelada recentemente?
Além disso, as UBSs se encontram com estruturas precárias, falta de salas, equipamentos, insumos, recursos humanos destinados ao serviço de limpeza, assim como a falta de segurança para os servidores e usuários em algumas regiões, deixando os profissionais sem condições mínimas para realização do serviço. Apesar de muitas UBSs do tipo II não terem condições para aderir ao projeto Sala de Acolhimento ou ampliar o atendimento até as 22h, por conta da estrutura física e também pela carência de profissionais para tal atividade, a SES determinou o prosseguimento da implantação do projeto nessas unidades.
Outro ponto de estrangulamento é o fato da APS estar atuando como porta de entrada para emergência sem que haja estrutura física, de pessoal, insumos e sem qualquer sistema efetivo de referência na rede ou mesmo retaguarda – sendo estes itens de total importância para resolubilidade do atendimento e garantia de acesso a quem precisa.
O que vemos e ouvimos diariamente são hospitais e UPAs de portas fechadas para pacientes classificados como amarelos e encaminhando pacientes para as UBSs. Surge daí o questionamento sobre quais medidas reais serão tomadas para que os pacientes encaminhados pelas salas de acolhimento das unidades possam de fato ser atendidos.
Temos consciência do papel do enfermeiro como protagonista na implementação de ações que realmente trarão impacto no acesso e na eficiência do atendimento, a respeito do que já acontece a muitos anos nos países desenvolvidos e em iniciativas de sucesso, como o “Projeto Autonomia do Enfermeiro” em Santa Catarina. O que estamos buscando há anos é sermos ouvidos, e que a Gestão veja os enfermeiros como parceiros para “pensar e incentivar” soluções, pois estes vivem o dia-dia e estão empoderados para apontar propostas viáveis.
O SindEnfermeiro é a favor da implantação de salas de acolhimento nas UBSs, assim como sempre seremos a favor de levar acesso a quem mais precisa. No entanto, é impossível se mostrar favorável às imposições que a Secretaria de Saúde faz para que todas as UBSs Tipo II realizem a adesão aos projetos sem ter as condições adequadas.
Para o êxito desse projeto, entendemos que é necessário:
– Nomear novos profissionais e aumentar a previsão de carga horária de profissionais de enfermagem para as Salas de Acolhimento e para terceiro turno;
– Ampliar a cobertura de Estratégia de Saúde da Família, alcançando pelo menos as populações mais vulneráveis do DF.
– Estabelecer fluxo seguro de referência e contra-referência de pacientes;
– Incentivar e selecionar enfermeiros com perfil para atuar nas salas de acolhimento, assim como promover treinamento inicial e capacitação periódica aos profissionais da APS;
– Ampliar e melhorar as condições de infraestrutura das unidades (estrutura física, sistema e acesso à internet, insumos e exames) e;
– Garantir a presença de mais vigilantes para dar segurança aos servidores, usuários, bem como ao patrimônio público.
Reiteramos nossa disposição em somar esforços e, assim como já exposto por este sindicato em diversas ocasiões com a Gestão e em diversos documentos, buscamos a oportunidade de apontar soluções realmente viáveis e em parcerias com outras instituições representativas da enfermagem, trabalhar nas estratégias para alcançá-las, incluindo planejamento, execução e capacitação dos servidores, pois temos certeza que é a ENFERMAGEM do DF que irá fazer toda a diferença!